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Bom negócio

De volta à fotografia, com uma pequena história do passado recente do M. V. M. a servir de preâmbulo:

Em 2010, quando comecei a fotografar com uma compacta da Canon, reparei que em certas fotografias as linhas rectas mais próximas dos limites do enquadramento apareciam distorcidas, o que dava aos imóveis altos um aspecto caricatural, como se tivessem sido projectados por um autor de banda desenhada e não por um arquitecto.

Esta distorção era de tal maneira severa que me levou à assistência da Canon, onde me esclareceram que essa distorção era natural em câmaras daquele tipo. Apercebi-me de imediato que precisava de uma câmara melhor, porque era intolerável ver as fotografias tiradas com distâncias focais curtas.

E também precisava de boas objectivas. A informação que fui recolhendo trouxe ao meu conhecimento que esse fenómeno hediondo se chama «distorção de barril», importação directa e acéfala da expressão inglesa barrel distortion. Mais ainda: aprendi que nem todas as objectivas resolvem satisfatoriamente este problema.

Deste modo, como um gato que outrora tivesse caído num caldeirão de água em ebulição, a possibilidade de uma objectiva grande-angular provocar este tipo de distorção causou-me sempre enormes receios e desconfiança. A 17mm que vinha com a Olympus E-P1 tinha essa distorção em níveis assustadores, mas era automaticamente corrigida pelo processador e pelos programas de edição de imagem que a reconhecem. A OM 28mm-f/3.5, ao contrário da 28mm-f/2.8 que experimentei em tempos, era quase isenta de distorção; será que tinha cometido um erro grosseiro ao trocá-la pela Vivitar 24mm-f/2.8?

As digitalizações do primeiro rolo que expus com esta última objectiva mostraram que não tinha razões para recear. Há um bocadinho de distorção, mas é negligenciável. Deste modo – e, com isto, concluo as minhas impressões acerca da Vivitar 24mm-f/2.8 –, apenas me merecem reparos dois problemas que se tornaram aparentes, quer nos testes iniciais, quer nas digitalizações: a sensibilidade ao excesso de luz e um escurecimento muito pronunciado dos cantos da imagem (vignetting). Tudo o resto é boas notícias: as cores são boas, as aberrações cromáticas muito bem controladas, a distorção mínima. Nada mau para uma objectiva que foi lançada para ser um sucedâneo barato das Olympus OM.

Posso, depois de tudo isto, concluir que fiz um bom negócio com a Vivitar. Soy muy contento.

M. V. M.

De volta à fotografia

Vamos voltar à fotografia, embora correndo o risco de alguns leitores desejarem que eu tivesse continuado a escrever sobre as minhas idiossincrasias musicais. É que o tema, hoje, é fotografia analógica.

Por uma conjugação aleatória de factores, estou a fazer duas experiências em simultâneo. Uma já sabem qual é: tem a Vivitar 24mm-f/2.8 por objecto. A outra é o Kodak Ultramax 400, um rolo de película a cores cujos resultados, ao ver as fotografias do meu amigo flickriano Tobi Gaulke, me pareceram suficientemente interessantes para justificar o acréscimo de preço em relação ao Agfa Vista (que, como de resto sabemos, está em vias de extinção).

Experimentar duas coisas ao mesmo tempo nunca é boa ideia, porque não é possível determinar qual dos componentes contribuiu para um determinado resultado: a saturação das cores – o que se nomeia a título meramente exemplificativo e hipotético – é trazida pela película ou pela objectiva? É evidente que tenho um meio de aferir objectivamente o valor do Ultramax, que é usar as objectivas com as quais tenho familiaridade, mas talvez agora os leitores compreendam por que me preocupei em fazer testes com a Vivitar 24mm com vista a determinar as suas características em relação à cor.

Ainda não posso dizer seja o que for quanto ao Kodak Ultramax, mas posso pronunciar-me acerca da película que usei anteriormente, a qual também havia estreado: a Ilford Pan 100. É uma versão mais grosseira do FP4, com a mesma tendência para exagerar as altas luzes e um pouco menos de acutância, mas é uma boa alternativa ao FP4, atenta a diferença de preço.

Houve qualquer coisa que correu muito mal com este rolo Ilford Pan 100: os últimos sete ou oito fotogramas estavam horrivelmente estourados, de uma forma que normalmente acontece quando se abre a tampa da câmara antes de rebobinar a película, mas eu tenho a certeza que não fiz nada disso. Eu sou honesto nessas coisas e já fiz esta asneira uma vez; não faria qualquer tipo de sentido estar a negar a pretensa falha diante de mim mesmo. Não foi essa a causa do problema. Aliás, se fosse, estaria bem menos preocupado, porque conheceria a causa. Isto pode ser uma falha clamorosa do fotómetro ou uma infiltração de luz na câmara. Não sei. Terei de mandar verificar a câmara.

Este problema deixou-me de tal maneira abúlico que só hoje arranjei coragem de me referir a ele no Número f/, apesar de ter as digitalizações desde Quarta-feira. Foi certamente esta a razão por que escrevi sobre outros temas que não a fotografia nos textos anteriores. Como Thomas Hobbes poderia ter dito perante esta minha perplexidade, oh well.

Os meus testes

Isto aqui no Número f/ foi uma verdadeira overdose de técnica nos últimos dias, mas teve a sua justificação. Não simplesmente por ter uma objectiva a que, impropriamente, chamo nova – e lembrem-se sempre que as objectivas são o coração de um sistema fotográfico –, mas porque estes temas são do interesse do leitor. E do autor também, claro.

É evidente que estes testes correm o risco de ser considerados a) um exercício fútil ou b) uma demonstração de pedanteria do autor. Fútil por o teste ser de uma objectiva que já não se fabrica há muitos anos, pedante por o autor não ter meios técnicos para estes testes, mas apresentá-los de qualquer modo. Que posso eu dizer acerca disto?

Quanto à futilidade, penso não ser nenhum delírio dizer que há um interesse cada vez maior pela fotografia analógica. Este interesse, que é uma reacção ao abastardamento da fotografia provocado pela generalização das câmaras digitais, faz com que exista um mercado considerável de material fotográfico usado. Poderão, ainda assim, replicar que testar uma objectiva de focagem manual é como ensaiar um automóvel dos anos 70 da década passada, mas qual é o problema? Muitos gostam de automóveis clássicos – ou pelo menos, se não podem conduzi-los, de desfrutá-los de outras formas. Acaso nunca viram o teste do Lamborghini Miura no Top Gear, ou os vídeos da colecção de Jay Leno? (Quanto a mim, se me dessem a escolher entre um Lamborghini Miura ou um daqueles origami que são os Lamborghini contemporâneos, não hesitaria nem por um segundo!)

No respeitante à pedanteria, eu não experimento equipamento por profissão, nem tenho a pretensão de dizer a última e mais autorizada palavra sobre os itens que experimento. As experiências que faço têm um único objectivo: o de saber se o material é idóneo a cumprir a função de que se vai encarregar. De resto, não ofereço largura de banda a produtos que, pela sua falta manifesta de qualidade, não merecem a minha atenção: eu usei o zoom 14-42 que a Olympus lançou juntamente com a E-P1, e a sua qualidade era de tal maneira medíocre que o devolvi no dia seguinte. Não me preocupei com as aberrações cromáticas ou a distorção, porque não valia a pena individualizar estes aspectos do desempenho quando tudo, nesta objectiva, era menos que sofrível. Este zoom era pior que a humilde panqueca de 17mm, e a falta de qualidade era tão evidente que não precisei de testar este ou aquele particular para atingir essa conclusão.

Os testes servem, deste modo, para verificar a conformidade de um produto com as minhas necessidades. Eu não quero que as minhas fotografias apresentem distorção geométrica e aberrações cromáticas, o que me levou a nunca me ter interessado pela Olympus OM 28mm-f/2.8 que experimentei: apesar de mais fácil e agradável de utilizar que a versão f/3.5 que usei até adquirir a Vivitar, os níveis de aberração cromática e distorção eram simplesmente inaceitáveis, pelo que o meio f-stop de vantagem não justificava uma eventual substituição.

Em poucas palavras: faço testes de material obsoleto em condições que, de tão subjectivas, dificilmente podem corresponder aos interesses e necessidades de outros leitores, o que pode ser havido como um pouco onanístico. Que interessa? O importante é que me divirto ao fazer estas experiências – mas não é uma diversão inteiramente inútil, porque aquelas ajudam-me a seleccionar o material que melhor corresponde às minhas intenções fotográficas. E não é absurdo que sejam úteis a alguns leitores – ou, pelo menos, que lhes sejam interessantes.

M. V. M.

Mais testes

Ainda não sei o que verdadeiramente vale a Vivitar 24mm-f/2.8 – só o saberei quando vir fotografias gravadas em película, tiradas com a câmara para a qual foi concebida –, mas é possível testar algumas qualidades montando-a na E-P1 por via de um adaptador. Estes testes não me dão resposta à questão de saber se há distorção geométrica, porque o que acontece, quando se monta uma objectiva concebida para o formato 135 numa câmara com sensor 4/3, é o equivalente a um corte da imagem pelas bordas. Como as distorções se manifestam nos extremos do enquadramento e estes são excluídos pelo crop factor, é impossível medir a distorção produzida pela objectiva com um mínimo de precisão.

Mas é possível aferir outras qualidades. Ou defeitos. Um dos grandes problemas das grande-angulares, especialmente das que são construídas para ser económicas, é o nível de aberrações cromáticas. Estas costumam manifestar-se nas orlas dos objectos, quando há contrastes apreciáveis, e consistem em manchas coloridas de cor roxa  quando a aberração cromática é no eixo vertical (aberração cromática lateral), ou num tom entre o violeta e o azul (purple fringing), no caso da aberração cromática transversal ou axial. A Olympus OM 28mm-f/3.5, que foi substituída pela Vivitar, apresentava aberrações cromáticas axiais extremamente agressivas, de um azul semelhante ao do equipamento do Futebol Clube do Porto (o que não me impressionava, atenta a minha aversão pelo futebol).

Outro aspecto mensurável é a resistência da objectiva à luz lateral, que se manifesta através de clarões e manchas na imagem. Como a Vivitar tem uma abertura maior que a OM 28mm-f/3.5, a lente frontal é também maior, logo mais exposta a estes fenómenos ópticos espúrios.

Comecemos por este último: como se pode ver na imagem acima, esta objectiva tem um problema bastante sério com a luz lateral. Embora estas aberrações apenas surjam quando se fotografa contra a luz em certos ângulos, a Vivitar é bastante vulnerável e precisa de ser usada com um para-sol. (Onde é que eu vou encontrar um para-sol para uma objectiva de 24 mm de distância focal e com um aro de 52 mm de diâmetro?)

Quanto às aberrações cromáticas, há boas e más notícias. A boa é que não existe praticamente aberração cromática lateral, que costuma ser a mais agressiva. Se houvesse, a linha vertical que se vê na imagem maior teria uma orla de cor azul ou roxa, o que não se manifesta. Em contrapartida, existe aberração cromática axial, como se vê na imagem mais pequena (que é um crop a 100% da maior). Mesmo assim esta deficiência é bastante discreta e o nível geral de aberrações cromáticas é muito melhor do que eu esperava.

A Vivitar é, claramente, uma objectiva que foi concebida para ser vendida aos milhões a um preço acessível, pelo que não podia esperar um desempenho óptico perfeito. Contudo, a julgar por estas experiências, é uma objectiva com um excelente conjunto de qualidades. Estas ainda não são conclusões definitivas, mas parece-me que tenho motivos para ficar satisfeito. Muito satisfeito. Preciso é de um para-sol.

M. V. M.

Eu, nerd da técnica

Ontem, quando experimentei a Vivitar 24mm-f/2.8 montada na câmara digital por via de um adaptador, usei como referência uma objectiva concebida para o sensor da E-P1: a 17mm-f/2.8 (que, pelas suas dimensões, se integra na categoria das objectivas pancake, embora nunca me tenha passado pela cabeça barrá-la com manteiga de amendoim). Contudo, aconteceu algo que me deixou perplexo e transportou o meu lado gearhead para altitudes jamais alcançadas.

Para fazer o teste, em que usei a referida panqueca como referência e a 50mm-f/1.4 para comparação com a Vivitar, comutei o comando dos modos de exposição para a posição A (prioridade à abertura), seleccionando a abertura manualmente e deixando que a câmara escolhesse automaticamente o tempo de exposição; como conheço a tendência da câmara para estourar as altas luzes, usei a compensação da exposição em -0,3 EV. Regulei o ISO em 200, para não ter de recorrer ao tripé e, por fim, certifiquei-me que as três objectivas estavam na abertura f/4.

Depois de colhidas as imagens, deu-me a curiosidade de ver qual foi o tempo de exposição que a câmara seleccionou. Para minha surpresa, nem todas as fotografias foram feitas com a mesma exposição: a panqueca teve direito a um valor de 1/160, ao passo que as objectivas de focagem manual induziram a câmara a usar o tempo de 1/125, o que é 0,3 EV mais longo. E isto vê-se nas fotografias, pois é notório que a imagem colhida com a panqueca tem mais contraste e cores mais brilhantes (embora, na verdade, seja uma diferença subtil).

Não sei por que isto aconteceu. Teoricamente, as três exposições deveriam ter durado o mesmo tempo, mas não duraram. Recorrendo à lei da reciprocidade, a um tempo de exposição mais curto corresponde uma abertura maior, pelo que a câmara não leu a abertura das objectivas de focagem manual como f/4, mas como f/3.5 ou qualquer coisa parecida. (Já devia ter dito que a panqueca não tem um anel de selecção das aberturas, pelo que é na câmara que esta escolha se faz, ao passo que as OM, evidentemente, têm o comando da abertura na própria objectiva.)

Uma explicação possível está na perda de luz induzida pelo adaptador. Esta peça de equipamento serve para montar as objectivas adaptadas a uma distância relativamente ao plano focal idêntica àquela que existe nas câmaras para as quais essas objectivas foram criadas. É assim, além de um adaptador, um espaçador. Ora, a lente posterior da panqueca fica manifestamente mais próxima do sensor do que as das objectivas concebidas para o sistema OM, pelo que esta hipotética perda de luz se torna plausível. A única coisa que tenho como certa, porém, é que existe uma divergência entre a abertura assumida pelo processador quanto às três objectivas, mas não faço ideia do que aconteceu.

Tenho a consciência de que este foi, de longe, o texto mais maçador e inútil do Número f/, mas a verdade é que esta discrepância dos tempos de exposição, embora ligeira, não deixou de me intrigar. Como não tenho um cérebro vocacionado para equações, não faço a menor ideia do que se passou. Uma coisa é certa – se eu decidisse abrir um tópico nos fóruns do Digital Photography Review com este assunto, os cérebros da comunidade fotográfica mundial iam explodir como vulcões.

M. V. M.

Primeiras impressões

Hoje fiz uma sessão fotográfica inteira com uma grande-angular, o que nunca me tinha acontecido. A objectiva foi, como quem leu o texto de ontem já calculou por esta altura, a nova Vivitar 24mm-f/2.8. Mas antes, uma pequena divagação histórica:

A Vivitar faz parte de um grupo de companhias que ofereciam alternativas baratas às objectivas da Nikon, Canon, Olympus e Pentax. Mais tarde essas marcas caíram em declínio e o seu lugar é agora ocupado pela Sigma, Tamron e Tokina. No caso da Vivitar, empresa fundada em 1938 como Ponder and Best por Max Ponder e John Best, esta sociedade concorria, nos anos 70 do século passado, com os principais fabricantes de objectivas. A empresa contratou designers e fabricantes como a Kino Precision, a Tokina e a Cosina – que é, ao que descobri, a fabricante da minha 24mm –, entre outras, para produzir as suas objectivas. A Vivitar ganhou a reputação de proponente de objectivas de boa qualidade a preços modestos. Seguiram-se-lhe sucedâneas como a Kiron, Soligor e outras, que eram essencialmente os designs da Vivitar com outras denominações e algumas diferenças cosméticas.

Confessei no texto de ontem que, apesar de saber que as Vivitar não são nada más, tinha alguns receios quanto à cor. E consultas ociosas a alguns websites fizeram-me temer que a nitidez fosse uma fraqueza da 24mm-f/2.8. Enquanto vinha de fazer uma fotografia de um pormenor arquitectónico da interessantíssima igreja do Foco (ou, para os mais beatos, «Igreja da Paróquia de Nossa Senhora da Boavista»), tive, talvez pela santidade do local que acabara de fotografar, uma revelação que fez de mim um verdadeiro Paulo de Tarso na estrada de Damasco: eu posso usar a Vivitar com a E-P1, já que tenho o adaptador de OM para Micro 4/3! E até me dá uma distância focal agradável, já que o crop factor faz com que a objectiva se porte como uma 48mm.

Isto quer dizer que também posso fazer testes sem ter de esperar pelas revelações do rolo que estou a usar presentemente. E, se bem o pensei, melhor o fiz: ao chegar a casa, montei a panqueca 17mm-f/2.8 na E-P1 e fotografei o meu pastiche kandinskiano. Depois, sempre com a câmara no modo de prioridade à abertura e usando f/4 em todas as experiências, montei a Vivitar e, depois, a OM 50mm-f/1.4; depois disto editei as imagens para que fossem idênticas quanto à iluminação. É que o DxO introduziu uma série de parâmetros correctivos ao identificar a fotografia tirada com a panqueca, o que incluiu a compensação de exposição. O resultado da experiência foi como se segue:

Com a Pancake 17mm-f/2.8
Com a Vivitar 24mm-f/2.8
Com a OM 50mm-f/1.4

Descontada a perda de contraste e de vibração que, por qualquer motivo, acontece quando descarrego imagens para o blogue, posso concluir que não há diferenças substanciais quanto à qualidade das cores. Quando muito, a imagem obtida com a 17mm parece um pouco mais contrastada e com cores mais saturadas, mas pode haver aqui o factor espúrio dos algoritmos do DxO. A verdadeira comparação, deste modo, é entre a Vivitar e a Zuiko 50mm-f/1.4.

Não tinha motivos para recear. As cores até parecem ligeiramente melhores com a Vivitar, mas a diferença, se existe, é marginal. Quanto à nitidez (descontada a dificuldade em focar manualmente com a E-P1), também não parece haver motivo para preocupações: os níveis de nitidez são idênticos

O verdadeiro teste é o que resultar do uso da Vivitar com a OM-2n e com película. Prefiro esperar pelos resultados para retirar mais conclusões quanto ao desempenho, especialmente para saber se há distorção geométrica e aberrações cromáticas. O que posso dizer, para já, é que a distância focal de 24mm é consideravelmente melhor que a de 28mm para arquitectura. É uma distância focal que nos obriga a aproximar-nos mais dos objectos e, muito simplesmente, cabem mais coisas no enquadramento. As diagonais são, como seria de esperar, mais pronunciadas do que as que obtinha com a OM 28mm-f/3.5, mas ainda sem aquela dinâmica delirante das ultra grande-angulares. Mesmo assim é um bom compromisso; diria que esta objectiva é ideal para fotografia de arquitectura e interiores.

M. V. M.

Um negócio maluco

A minha objectiva nova (por assim dizer)

Hoje fiz algo que não fazia há cerca de cinco anos: adquiri equipamento fotográfico. Estou a escrever isto incorrendo, aparentemente, na maior incoerência, pois num texto anterior quase jurei que o Número f/ se tornaria, desde essa data, um «repositório da memória da fotografia» que se fez antes das manias da iPhonografia e da «fotografia computacional» que estão a destruir o sentido de fotografar, mas a peça de equipamento que adquiri hoje, 12 de Maio de 2018, é da era anterior ao advento da fotografia digital, pelo que não há incoerência nenhuma.

A aludida peça de equipamento é uma objectiva. Eu tinha – e continuo a ter, como verão adiante – três objectivas, que cobriam (cobrem) as distâncias focais mais importantes: uma grande-angular de 28mm, uma normal de 50mm e uma teleobjectiva de 135mm. Embora estivesse razoavelmente satisfeito com as duas últimas, a OM 28mm-f/3.5 tinha alguns problemas: a abertura máxima limitada tornava-a difícil de utilizar em condições de iluminação ténue, a imagem no visor era demasiado escura (o que dificultava a composição em certas circunstâncias), não existia nenhuma marcação intermédia entre a abertura máxima de f/3.5 e o passo seguinte, que era f/5.6 e, sobretudo, o escurecimento dos cantos – a que alguns chamam «vinhetagem» – na abertura máxima era intolerável. Ah – e, por qualquer motivo que desconheço, o ajustamento da focagem produzia uma alteração da perspectiva, pelo que funcionava como um zoom, embora de intervalo limitado.

Além disto, apesar de fazer a esmagadora maioria das fotografias com a 50mm, tenho vindo a nutrir uma apreciação crescente pelo uso que alguns fazem (o meu amigo Hendrik Lohmann, por exemplo) das grande-angulares. Há qualquer coisa de mágico nas diagonais e na sensação de profundidade que estas objectivas permitem. 28mm é uma boa distância focal de grande-angular, mas ainda não é visível a magia das objectivas mais curtas.

Pois bem, hoje fiz um negócio maluco: vi uma objectiva de 24mm à venda por um valor razoável e propus dar a minha OM 28mm em troca, pagando o valor residual. Foi desta maneira que me tornei o feliz (assim o espero) proprietário de uma objectiva Vivitar 24mm-f/2.8. Não tenho grandes certezas quanto a ganhos na qualidade absoluta de imagem, mas ganhei um f-stop suplementar que me vai ser útil e os 4mm de distância focal representam uma vantagem de quase 10º de ângulo de visão. Mais curta, mais rápida, mais larga – são estas, na teoria, as vantagens da minha nova Vivitar.

Ainda por cima, esta objectiva está absolutamente imaculada. O anel de focagem podia ser um bocadinho mais firme, mas o das aberturas funciona com uma precisão notável. O vidro está num estado impecável, não há fungos nem poeiras e o cano não tem deteriorações assinaláveis. Mesmo as referências gravadas com tinta branca, que tendem a ficar amarelecidas com o tempo, estão impecavelmente brancas. Vê-se bem que foi pouco usada.

Estou ansioso por experimentá-la. Sei que não é nenhuma Olympus OM (a OM 24mm-f/2.8 também estava disponível, mas custava o dobro!) e tenho alguma desconfiança quanto à apresentação das cores, mas não acredito que as diferenças entre esta sucedânea das OM e as originais sejam chocantes. De resto, a minha fotografia não se caracteriza pelo uso intensivo de distâncias focais de grande-angular, pelo que, mesmo que esta objectiva não seja a melhor grande-angular existente à superfície da Terra, foi uma troca vantajosa. E quem sabe se, atentas as características da sua distância focal, não vou passar a explorar mais as possibilidades das grande-angulares?

Depois eu apresento um relatório circunstanciado e as conclusões. Stay tuned.

M. V. M.

A efeméride que ficou por assinalar

Deixei por assinalar, propositadamente, uma efeméride. No dia 27 de Abril decorreram sete anos sobre a data em que adquiri a minha primeira câmara a sério, a Olympus E-P1. Ao fim de todo este tempo, com o entusiasmo inicial já morto e enterrado, já posso olhar friamente para uma câmara que me lançou numa aventura extraordinária, mas não era de maneira nenhuma sem defeitos.

A E-P1 é, ainda hoje, uma câmara extremamente bonita, mas essa beleza é apenas superficial. Por baixo de uma fina casquinha de aço – tão fina que a baioneta se desloca com o peso de objectivas mais substanciais quando montada no tripé! – está um châssis de plástico, o que tem um significado evidente: esta câmara não valia o preço escandalosamente alto que a Olympus pedia por ela. Comprei o meu exemplar por €377, com a objectiva 17mm-f/2.8 e o visor VF-1, o que parece justo, mas quem pagou mais de €800 só pelo corpo quando a E-P1 foi lançada tem todo o direito de se sentir ludibriado.

Até porque, convenhamos, a qualidade de imagem não é grande coisa. Não por causa dos 12,3 megapixéis do sensor Panasonic, mais que suficientes para impressões de tamanhos razoáveis sem perda de resolução – o que é muito mais do que se pode exigir da película 135 –, mas pela tendência intolerável para estourar as altas luzes. Este era um vício redibitório que me devia ter mantido longe desta câmara, mas eu era demasiado ignorante e estava demasiado entusiasmado pela beleza da E-P1 para dar atenção às críticas que apontavam esta falha gigantesca.

Depois havia o ruído. Mesmo com o ISO regulado no mínimo, havia ruído nas áreas de sombra. Com a sensibilidade nos 400, os resultados eram já inaceitáveis. O sensor da E-P1 era simplesmente medíocre, mesmo de acordo com os padrões de 2009, ano em que a câmara foi lançada. Um sensor que aquecia de tal maneira que causava o aparecimento de pixéis espúrios na imagem quando fazia exposições longas. E havia ainda os menus complicadíssimos, as funções inacessíveis, a falta de ergonomia dos comandos e o absoluto desespero que era focar manualmente usando a função de ampliação da imagem no ecrã. Não que a focagem automática fosse muito melhor: eu descarreguei o firmware 1.4, que melhorou um pouco a velocidade da focagem, mas esta actualização pouco fez para minorar os inconvenientes de um sistema de focagem que fica muito atrás do das DSLR.

Por fim, a visualização através do ecrã é, simplesmente, a pior forma de compor e enquadrar que se pode imaginar. Mesmo com o brilho no máximo, era frequente não conseguir ver o que se passava no enquadramento quando a luz era desfavorável. Não admira que esta câmara tenha sido substituída, ao fim de apenas cinco meses de produção, pela E-P2, que estava preparada para montar um visor electrónico.

Claro que nem tudo foi mau. Foi com a E-P1 que aprendi ser muito melhor fotografar com objectivas de distância focal fixa do que com zooms. E tive acesso às OM. Contudo, nos primeiros tempos pouco aprendi. Tirava fotografias à toa, fotografias que não interessavam nem ao Menino Jesus, só porque sim. Mais tarde – não sei explicar ao certo porquê, mas foi antes da aquisição da OM-2n – aprendi que as fotografias, mesmo «digitais», são demasiado preciosas para desperdiçar. De nada adianta fazer milhares de fotografias que não dizem nada, mesmo se forem usadas técnicas fotográficas sofisticadas e difíceis.

Quer dizer: o que eu tinha era uma compacta, com a diferença de que podia montar objectivas diferentes em lugar de estar sujeito a uma só, como com as outras compactas. A fotografia é uma daquelas coisas em que dava jeito nascer ensinado. Até porque os erros costumam sair caros – a menos, claro, que se seja um turista japonês, classe mais propensa a comprar as E-P1.

M. V. M.

Fim-de-semana agridoce

Na sexta-feira recebi um email de efeito retardado: de início não me pareceu nada a que devesse dedicar excessiva preocupação, mas com o tempo compreendi que tinha razões mais que suficientes para me consternar.

O email foi remetido pela editora que manifestou interesse na publicação da minha monografia. Aquando do primeiro contacto, asseveraram-me que a obra seria editada no segundo trimestre deste ano, mais concretamente em Maio; chegado a Maio, depois de esperar em vão pelo contrato e pelas provas tipográficas, recebo este email em que me é dito que a edição foi atrasada para dar lugar a edições «urgentes» e que só asseguravam o lançamento para Outubro. Até aqui tudo bem; não me importaria de esperar. Contudo, logo de seguida dizem-me que compreenderiam no caso de eu «optar pela publicação em outra editora».

Não sei como interpretar isto; estarão a dizer-me, de forma não muito subtil, que perderam o interesse na edição e que devo procurar outra editora? A minha reacção inicial não foi interpretar a mensagem neste sentido: pelo contrário, vislumbrei aqui uma oportunidade de celebrar um contrato mais vantajoso do que aquele que me foi proposto. Agora não sei muito bem o que pensar. Foi um murro no estômago. E fiz figura de parvo diante de todos aqueles com quem partilhei o meu entusiasmo. A confiança já não é o que era.

Nem tudo foi lamentações nesta semana. Hoje mesmo encontrei-me com o meu amigo alemão da Nikon Df, o Hendrik Lohmann, e a sua encantadora mulher (que me surpreendeu por ter uma Fujifilm XT20). Apesar de nos contactarmos via Flickr, o que é certo é que já não nos víamos há quatro anos e não há nada que substitua uma conversa face a face. Foram umas horas imensamente bem passadas.

O Hendrik evoluiu imenso desde o nosso primeiro encontro, e o equipamento teve uma influência absolutamente decisiva nessa evolução. Quando o conheci, fotografava exclusivamente com a 50mm-f/1.8 que vinha com a câmara, mas entretanto comprou um zoom 14-24-f/2.8, um bacamarte de uma objectiva com uma lente frontal do tamanho de uma lâmpada de iluminação pública. Desde então a sua fotografia passou a basear-se na perspectiva absolutamente delirante das ultra grande-angulares, além de manter o preto-e-branco e o gosto, que partilhamos, por contrastes acentuados. Não estou com isto a dizer que o equipamento faz fotografar melhor – tal seria uma estultícia –; o que digo é que o Hendrik adquiriu uma forma de expressão nova por poder explorar perspectivas que as objectivas standard não permitem. Para terem uma ideia do que estou a dizer, dêem uma olhadela aqui.

Outro episódio deste fim-de-semana é o que se segue. Penso que não contei isto aos meus leitores, mas ofereci à minha sobrinha Maria Luís, por ocasião do seu 6.º aniversário, uma máquina fotográfica descartável, daquelas que trazem um rolo dentro e se deitam fora depois de extraída a película. Pois bem: entretanto recebi as digitalizações do rolo. As fotografias que ela tirou ficaram deliciosas!

Antes, porém, deixem-me dizer-vos que o sorriso que iluminou o rosto dela, quando lhe ofereci a máquina, foi simplesmente impossível de descrever. Tinha acabado de lhe dar uma máquina fotográfica, com um visor como as máquinas a sério. Tudo a um nível muito superior ao das fotografias tiradas com um telemóvel – e muito mais importante. Nunca vou esquecer aquele sorriso, nem a forma instintiva como ela levou a máquina ao olho direito (que é como uma câmara deve ser usada: essas coisas de visualizar num ecrã é fingir que se fotografa, não é fotografar).

A rapariga fotografou, essencialmente, os colegas e amigos que foram à sua festa de aniversário, mas os retratos – posso chamar-lhes assim sem exagero nem receio de parecer excessivamente influenciado pelo afecto que nutro pela Maria Luís – ficaram simplesmente enternecedores. E muito bem executados. Se não acreditam, vejam este:

Talvez um dia o M. V. M. consiga fazer retratos assim

E a reacção da Maria Luís ao ver as digitalizações no computador não foi menos interessante. Propus-lhe mandar imprimir algumas das fotografias, no que ela assentiu; quando lhe perguntei quais queria ter em formato-papel, ela respondeu prontamente: «todas!» É evidente que não vão ser todas: há fotografias falhadas (mas qual de nós é capaz de expor um rolo, ou completar uma sessão fotográfica, sem falhar fotografias? Eu cá não sou, apesar de todo o cuidado que ponho na escolha dos motivos), mas a verdade é que são poucas. São mesmo poucas. Não estou a ser nepotista.

Há coisas que me deixam feliz e me fazem esquecer os contratempos.

M. V. M.

Explanatório

Fotografia pelo brilhantíssimo Fred Herzog. Provavelmente não foi tirada com um iPhone.

Aqui estou de novo, e mais uma vez em modo explanatório. Sim, porque este texto é uma explanação: o leitor ficará a saber, se tiver paciência para ler a primeira linha do próximo parágrafo (ou as duas primeiras, se estiver a usar um dispositivo móvel na vertical), por que razão o Número f/ caiu mais uma vez no letargo.

A razão é simples: não houve textos novos porque não há nada a dizer. O leitor decerto já se viu numa daquelas situações embaraçosas em que está na presença de alguém e não tem nada para lhe dizer; quando isto me acontece, por vezes prefiro ficar calado a fazer conversa fiada. O interlocutor poderá não estar interessado em discutir o tempo – excepto no caso improvável de ser um técnico do Instituto Português do Mar e da Atmosfera – ou em tagarelar sobre futebol (para o qual não tenho vocação). O silêncio, nestes casos, é a melhor solução.

Não se está a passar nada de interessante no Planeta Fotografia. Pelo contrário: a fotografia caminha a passo de corrida para a sua própria anulação, vítima da contradição entre a sua função de fixar momentos efémeros e ter-se tornado ela mesma efémera à custa da fotografia digital – e sobretudo dos telemóveis. Visitar a Internet apenas serve para confirmar este niilismo da fotografia. Mesmo o meu bloguista favorito, Michael C. Johnston do The Online Photographer, passa uma parte substancial do seu tempo a tentar convencer os seus leitores que o iPhone é uma máquina fotográfica altamente capaz. No Digital Photography Review a conversa é a mesma: os horrores de viver na Rússia putiniana reportados fotograficamente através de um iPhone, um adaptador de filtros quadrados para smartphones – a Cokin que se cuide! – e mesmo uma objectiva anamórfica para «cineastas do smartphone» (categoria que não existe, mas se Steven Soderbergh fez um filme com iPhones, a Arri e a RED que se cuidem). Querem, à força toda, convencer-nos que o smartphone é uma máquina fotográfica capaz de substituir o equipamento convencional, o que não passa de um delírio engendrado por marketers agressivos mas está a encontrar terreno fértil entre as multidões de consumidores que adoram gadgets caros. Entre eles muitos amadores de fotografia. (Que digo? Amadores de equipamento fotográfico, assim é que é.)

Os assuntos mais comentados entre a comunidade fotográfica são um teste à resolução do sensor da Sony α7 e um aumento do preço das Leica nos Estados Unidos. Este último assunto serve para desnudar publicamente o pior da humanidade – a inveja, o desdém de raposa que, não chegando às uvas, diz que estão verdes. Há também – imagine-se – uma aplicação que dá automaticamente às fotografias um aspecto «artístico», depois de um algoritmo ter estudado as tendências «artísticas» das fotografias descarregadas pelo utilizador (chamemos-lhe assim, porque «fotógrafo» parece-me um substantivo algo excessivo).

Este é o estado a que a fotografia chegou. Idolatram-se os gadgets, mas não se reflecte, nem por um segundo, no facto de estes estarem a erodir a própria essência da fotografia. Para onde quer que nos voltemos, as notícias são irrelevantes ou preocupantes. A «arte» está agora ao alcance de todos sem que seja necessário pensar e criar: basta correr um algoritmo, processo a que chamam «inteligência artificial». Todos somos artistas instantâneos. Ó admirável mundo novo!

Entretanto, a fotografia vai-se banalizando cada vez mais. E assim continuará até se tornar numa metalinguagem em que a expressão oral é substituída pelas imagens. Num mundo em que a realidade é substituída pelas imagens. Perante tudo isto, que há a dizer? Perante tudo isto, que há a fazer? Cada vez mais, só vejo uma função para o Número f/: a de ser um repositório da memória da fotografia que se fez antes de esta onda incompreensível de banalidade e aviltamento ter destruído por completo o sentido de fotografar. Não me parece útil escrever sobre quaisquer outros aspectos da fotografia.

M. V. M.